
Revisão final das apurações e vantagens de regularização espontânea perante os Fiscos

Juliana Skolimovski
11/28/2024
Com o encerramento do prazo para adesão ao Programa Litígio Zero (em 31.10.2024), contribuintes interessados na regularização de débitos e pendências perante a Receita Federal do Brasil (“RFB”) e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”), deverão avaliar a pertinência e relevância de demais instrumentos disponíveis para quitação de débitos tributários perante o Fisco Federal.
Além dos parcelamentos convencionais, individuais e com condições de negociação específicas a depender da natureza do débito parcelado, atualmente vigem programas específicos de transação de débitos perante RFB, além do Governo do Estado de São Paulo e Prefeitura Municipal de São Paulo:
PGFN - Transação por Edital PGDAU 06/2024
o Débitos inscritos em Dívida Ativa da União;
o Valor em negociação: inferior ou igual a R$ 45.000.000,00; e
o Prazo para adesão: 31/01/2025.
PGFN - Transação por Edital PGDAU 07/2024
o Débitos do Simples Nacional inscritos em Dívida Ativa da União;
o Valor em negociação: inferior ou igual a R$ 28.240,00 (20 salários-mínimos); e
o Prazo para adesão: 29/11/2024.
PGFN - Transação Individual
o Débitos inscritos em Dívida Ativa da União e do FGTS;
o Valor em negociação: Entre R$ 1.000.000,000 e R$ 10.000.000,00;
o Condições especificas a depender da capacidade de pagamento do contribuinte, natureza dos débitos negociados e existência de garantias.
RFB - Transação Individual
o Débitos com contencioso administrativo ativo perante a RFB;
o Valor em negociação: Superior a R$ 10.000.000,00;
o Condições especificas a depender da capacidade de pagamento do contribuinte, natureza dos débitos negociados e existência de garantias.
PGE-SP – Acordo Paulista
o Débitos inscritos em Dívida Ativa Estadual (ICMS, ITCMD, IPVA);
o Condições especificas a depender da capacidade de pagamento do contribuinte, natureza dos débitos negociados e existência de garantias.
PGE-SP – Transação por Edital n. 03/2024
o Débitos de ICMS inscritos em Dívida Ativa Estadual;
o Empresas em recuperação judicial, liquidação judicial/extrajudicial ou falência;
o Condições especificas a depender da capacidade de pagamento do contribuinte, natureza dos débitos negociados e existência de garantias;
o Prazo para adesão: 31/01/2025.
PMSP – Programa de Parcelamento Incentivado ('PPI')
o Débitos municipais, tributários ou não, inclusive os inscritos em Dívida Ativa;
o Prazo para adesão: 31/01/2025.
Caso o contribuinte possua contingências que não se enquadrem em algum dos programas e ainda não tenha sido objeto de fiscalização, ele poderá realizar o procedimento de denúncia espontânea, na forma prevista pelo art. 138º do Código Tributário Nacional (“CTN”).
Com o procedimento, o contribuinte deverá pagar o tributo reconhecido e ainda não quitado, somente acrescido dos respectivos juros de mora. São afastadas, portanto, as multas de mora (de até 20%) e de ofício (entre 50% e 150%), que seriam aplicadas pelas Autoridades Fiscais em caso de lavratura de auto de infração.
Para tanto, o contribuinte deve proceder com a revisão de suas apurações e, verificado o não pagamento ou o pagamento a menor dos tributos devidos, deverá proceder com seu pagamento e, a priori, posteriormente, retificar suas apurações e declarações.
A formalização da denúncia espontânea e o momento de pagamento do tributo varia conforme a legislação de cada ente federativo. Na esfera federal, o pagamento deve ocorrer antes da retificação das declarações, mantendo-se a espontaneidade do recolhimento, enquanto, na esfera municipal de São Paulo, por exemplo, deve ocorrer após apreciação do requerimento e intimação para pagamento.
Tais requisitos são critério essencial para a validação da denúncia espontânea pelo Fisco, podendo ser indeferida a quitação espontânea dos tributos e exigidas as multas caso verificado o não atendimento das formalidades para sua execução.
Especialmente na esfera federal, há grande discussão acerca da forma de pagamento elegível para realização de denúncia espontânea. Discutiu-se a possibilidade de quitação dos débitos pela via da compensação (federal) em virtude da (i) amplitude do termo pagamento previsto no art. 138º do CTN (“A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se fôr o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora”), o qual não remontaria, no artigo, apenas ao recolhimento da quantia devida em pecúnia, mas abrangeria, também, as demais formas de extinção do crédito tributário previstas no art. 156º do CTN, à semelhança de demais artigos que utilizam-se do termo “pagamento” como sinônimo de "quitação”, e (ii) impossibilidade de se afirmar que a submissão da compensação à posterior análise e homologação pela Autoridade Fiscal seria critério suficiente para apontar sua ineficiência para quitação dos débitos, em especial, considerando que mesmo os pagamentos em pecúnia sujeitam-se à validação do Fisco nos 5 anos posteriores ao recolhimento do tributo.
Apesar da tese defendida pelos contribuintes, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”), aprovou a Súmula CARF n. 203, fixando o entendimento de que a compensação não equivale a pagamento para fins de denúncia espontânea - tal posicionamento é alinhado aos julgados mais recentes pelo Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) sobre a matéria.
Especialmente em relação ao Município de São Paulo, registra-se que o PPI 2024, prorrogado até o dia 31 de janeiro de 2025, possibilita ao contribuinte a realização de denúncia espontânea diretamente no sistema do programa, que gerará automaticamente a guia para quitação do tributo. Com isso, pode o contribuinte usufruir de estrutura semelhante à denúncia espontânea via PPI 2024, sem necessidade de proceder com o requerimento administrativo e aguardar sua apreciação, mas somente com a indicação dos débitos a serem pagos. Ressalte-se, contudo, que o sistema da PMSP aplica automaticamente a multa de mora de 20% por recolhimento intempestivo do tributo - não obstante, com redução máxima de até 95%, em virtude dos benefícios do PPI, que pode ser mais interessante do que o procedimento clássico de denúncia espontânea, considerando que também há redução dos juros aplicados
A análise e revisão dos tributos já pagos é especialmente relevante, neste momento, para contribuintes que fizeram o early adoption das novas regras de preços de transferência, uma vez que a entrega do Arquivo Local e Arquivo Global se encerra no último dia útil deste ano, sendo momento oportuno para verificar a exatidão dos ajustes realizados e informações dispostas na ECF 2023.
Ressalta-se a importância de uma adequada revisão dos tributos pagos em períodos anteriores e cautela e auxílio de um profissional ao identificar a necessidade de ajustes em obrigações acessórias - uma vez que tais retificações não podem ser realizadas a qualquer tempo, sob risco de cobranças de multa pela Autoridade Fiscal que já estivesse ciente das inexatidões da declaração retificada.
O erro no preenchimento de declarações (bem como a não entrega destas) e o não pagamento de tributos, em sua totalidade ou parcialmente, implicam na exigência de multas não apenas sobre o valor dos débitos que deixaram de ser quitados pelos contribuintes, como eventualmente da própria operação registrada na declaração; caso verificada a presença de sonegação, fraude ou conluio, o percentual da multa poderá ser majorado. Na esfera federal, caso a Autoridade Fiscal verifique, ainda, que o contribuinte incorreu em qualquer das hipóteses de qualificação da multa (fraude, conluio ou sonegação) nos dois anos anteriores, é constatada a reincidência da prática, implicando na cobrança de multa de 150% sobre o débito constituído.
A revisão das práticas tributárias das companhias é relevante, ademais, em relação aos débitos que já são objeto de contencioso administrativo. Isso porque recentes mudanças na legislação e na jurisprudência afetaram em grande modo os efeitos no desfecho dos processos administrativos e o planejamento de ações judiciais.
Nesse sentido, destacamos a regulamentação da Lei do CARF (Lei n. 14.689/2023) e a edição da Instrução Normativa RFB n. 2.205/2024.
Visto o CARF ser órgão paritário composto por conselheiros representantes do Fisco Nacional e dos Contribuintes, por vezes, as deliberações podem implicar em empate de julgamento, sendo o voto de qualidade instrumento conferido ao Presidente da Turma (sempre representante da Fazenda Nacional) para desempate – na prática, em caso de empate na votação, seu voto é considerado com duplo peso; diante do aparente desequilíbrio entre contribuintes e Fazenda Nacional, a Lei do CARF prevê uma série de benefícios ao contribuinte que teve decisão final desfavorável.
Na hipótese de julgamento desfavorável por meio de voto de qualidade, serão excluídas as multas de ofício aplicadas sobre os débitos em exigência e eventual representação penal para fins fiscais, este também é o momento do contribuinte avaliar as probabilidades de êxito da demanda em instância administrativa superior e/ou esfera judicial, uma vez que, caso haja manifestação para pagamento dos débitos remanescentes em até 90 dias após a ciência da decisão, são excluídos, também, os juros moratórios. Caso haja a intenção de pagamento dos débitos, o contribuinte poderá fazê-lo mediante parcelamento em até 12 prestações e com créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL e precatórios.
Destaca-se, portanto, a importância do compliance fiscal e de regular revisão das obrigações tributárias para que as empresas apurem o mais breve possível eventuais irregularidades e falhas no cumprimento das obrigações acessórias e pagamento dos tributos, bem como, realizem a valoração de processos ativos e respectivas probabilidades de êxito.
A adoção de medidas de regularização e revisão de obrigações pode promover maior eficiência tributária nas empresas, especialmente considerando a análise de pertinência na inauguração ou na manutenção do contencioso administrativo.
Para mais esclarecimentos, entre em contato com nosso time: Waitman & Skolimovski