
Novas regras de tributação para aplicações financeiras e criptoativos
A publicação da Medida Provisória n. 1.303 (“MP1303”), em 11.06.2025, trouxe mudanças significativas à legislação do imposto de renda no que tange à tributação de aplicações financeiras e ativos virtuais.
Publicada como medida compensatória e alternativa ao Decreto n. 12.499/2025, que revogou parte dos aumentos de alíquota do IOF promovidos pelo Governo Federal nas últimas semanas, a MP1303 passa a alterar de forma relevante a legislação tributária, destacando-se, especialmente (i) a incidência de imposto de renda sobre investimentos antes isentos, (ii) a alíquota fixa de imposto de renda para aplicações financeiras, (iii) a majoração da alíquota de CSLL para fintechs e instituições de pagamento e (iv) a majoração da alíquota de IRRF sobre o pagamento de JCP.
Neste artigo, sinalizamos as principais mudanças trazidas sob o aspecto técnico.
Unificação e simplificação de regras tributárias
A MP1303 compila diversas regras referentes à tributação de aplicações financeiras e ativos virtuais, muitas das quais não representam nenhuma mudança ou mudanças pouco significativas em relação ao cenário tributário anterior, passando a unificar em um único diploma as diversas regras (antes esparsas na legislação).
Além da simples centralização de regras tributárias já existentes, a MP1303 parece ter buscado a unificação do tratamento tributário conferido aos diferentes tipos de aplicações financeiras, padronizando formas e alíquotas de tributação, bem como extinguindo isenções antes conferidas a aplicações especiais.
Ativos virtuais
Conforme já vínhamos alertando em nossa série de artigos O futuro da Tributação de Cripto, as recentes consultas públicas e propostas de regulação dos ativos virtuais pelo Banco Central do Brasil potencialmente decorrem de medida conjunta entre este órgão e a Receita Federal do Brasil de forma a possibilitar a correta identificação e tributação das operações envolvendo criptoativos de pessoas físicas e jurídicas residentes no país.
A MP1303 destaca-se por ter alinhado a tributação relativa a cripto com aquela incidente sobre outros ativos financeiros, em virtude da adoção do mecanismo de tributação por “ganhos líquidos” (já utilizado para ações e fundos imobiliários).
Desta forma, a partir da vigência da MP, os rendimentos auferidos em operações com criptoativos estarão sujeitos à alíquota de 17,5% de IRRF, independentemente do valor do ganho obtido (afastando-se a anterior isenção sobre rendimentos de até 35 mil reais mensais). Possibilita-se, portanto, a compensação entre perdas e ganhos e, ainda, a dedução dos custos e despesas cobrados pelos intermediários da operação, alcançando-se os "ganhos líquidos" correspondentes à base de cálculo da tributação.
Trata-se de relevante alteração para operadores de ativos virtuais, outrora sujeitos à tributação de tais rendimentos com mesmo tratamento que conferido aos ganhos de capital, ou seja, pela tabela progressiva de 15% a 22,5%.
Alíquota uniforme de IR de 17,5%
Com as alterações promovidas pela MP1303, há medida de unificação da tributação sobre os rendimentos de aplicações financeiras no País (dentre os quais, agora, incluem-se os ativos virtuais), prevendo-se sujeição à alíquota padrão de 17,5%.
Por rendimentos, entendem-se os juros, remunerações, prêmios, comissões, ágios, deságios, ganhos em eventos de amortização, resgate, liquidação e alienação, assim como os ganhos líquidos decorrentes de negociações de títulos mobiliários. Excepciona-se desta tributação os dividendos e os juros sobre capital próprio (“JCP”).
Com exceção às pessoas jurídicas integrantes do mercado financeiro (cujos rendimentos de aplicações financeiras comporão as bases de cálculo do IRPJ/CSLL), todos os demais operadores de aplicações financeiras estarão sujeitos à retenção do imposto de renda na fonte à alíquota de 17,5%; pessoas jurídicas isentas ou optantes pelo SIMPLES Nacional terão tal tributação como definitiva, enquanto para as demais pessoas jurídicas e pessoas físicas, a retenção na fonte representará mera antecipação do imposto a ser recolhido ao término do período de apuração.
Fim da Isenção sobre títulos incentivados
Como se sabe, os rendimentos de aplicações financeiras sobre títulos incentivados (LCI, CRI, CDA, WA, CDCA, LCA, CRA, CPR, LIG, LCD e títulos de investimento em infraestrutura previstos na Lei 12.431/11) não eram sujeitos à incidência de imposto de renda.
Com a vigência da MP1303, rendimentos auferidos sobre títulos de investimento emitidos a partir de 2026, estarão sujeitos à incidência de IRRF à alíquota de 5% quando pagos à pessoa física residente no país.
CSLL de instituições financeiras
Atualmente, instituições bancárias sofrem a incidência de alíquota majorada de CSLL sobre suas atividades, sujeitando-se à alíquota de 20% vis-a-vis a alíquota padrão de 9% para demais pessoas jurídicas e 15% para outras instituições financeiras.
Com a vigência da MP1303, instituições de pagamento, seguradoras, DTVMs, corretoras de câmbio e valores mobiliários, sociedades de crédito imobiliário e demais instituições financeiras reconhecidas pelo CMN (como as fintechs), que são sujeitas à alíquota de 9%, passarão a ser tributadas em 15%. Pessoas jurídicas de capitalização, por sua vez terão a alíquota majorada a 20%.
Revisão do aumento do IOF
Publicado conjuntamente à MP1303, o Decreto 12.499/2025 revogou e alterou parte das abruptas mudanças acerca da tributação de operações de crédito e câmbio pelo IOF.
Como parte das medidas dispostas no Decreto, restou (i) revogada a incidência de 0,38% de IOF-crédito sobre operações de “risco sacado”, permanecendo somente apenas a diária de 0,0082%, (ii) reduzida a zero a alíquota de IOF-crédito sobre prêmios de pessoas físicas para VGBL (em aportes anuais de até R$ 300 mil em uma mesma seguradora, até 31.12.2025, e em aportes anuais de até R$ 600 mil, a partir de 01.01.2026), (iii) reduzida a zero a alíquota de IOF-câmbio sobre retorno de recursos aplicados por investidor estrangeiro em participações no País e (iv) revogada a incidência de IOF à 0,38% sobre operações com cooperativas acima de R$100 milhões ao ano (ainda que mantida a incidência da alíquota diária).
Demais disposições
Tributação dos JCPs: A MP1303 promoveu a majoração da alíquota de IRRF incidente sobre o pagamento dos Juros sobre Capital Próprio aos beneficiários, alterando-se a alíquota de 15% para 20%
Apostas esportivas (BETs): A MP prevê a tributação pelo IRPJ do Gross Gaming Revenue das BETs (rendimento bruto das apostas auferidos após o pagamento dos prêmios aos apostadores) à alíquota de 18%, em oposição à atual alíquota de 12%.
Ressalta-se que a tributação em 18% já era a proposta original do Ministério da Fazenda à época em que debatido o PL das Apostas.
Empréstimos de títulos e valores mobiliários: Foram estabelecidas regras de forma a conferir segurança jurídica à tributação em operações de aluguel de títulos e valores mobiliários.
Foram abordadas hipóteses de reembolsos de rendimentos pelo emprestados, empréstimo por tomador isento ou dispensado do IRRF, alienação do ativo pelo tomador e mudança da titularidade entre emprestador e tomador.
Vigência e tramitação
Considerando a ampla gama de tributos tratados na MP 1303, sua vigência varia de acordo com a matéria tratada.
As alterações referentes ao IOF têm aplicação imediata a partir de sua publicação.
Alterações relativas às alíquotas de CSLL (particularmente relevantes às instituições de pagamento e fintechs) e à tributação das BETs, terão vigência a partir de outubro, ou seja, o quarto mês após a publicação da MP.
Por sua vez, demais dispositivos, especialmente os relativos à incidência de imposto de renda, terão vigência a partir de 01.01.2026.
Ressalta-se que, por tratar-se de medida provisória, a MP1303 tem vigência de 60 dias, prorrogáveis por mais 60, e devendo ser aprovada pelo Congresso Nacional neste período, sob pena de perder a validade.